São Paulo — “Rouba de quem rouba e paga de santo”. Foi assim que o policial civil Rogério de Almeida Felício, o Rogerinho (foto em destaque), foi descrito por sua companheira Danielle Bezerra, viúva de um ex-gerente do Primeiro Comando da Capital (PCC), em mensagem enviada em um grupo de WhatsApp.
A mensagem consta do relatório da Polícia Federal (PF) que indiciou o policial, Danielle e outros 12 envolvidos em crimes delatados pelo empresário Vinícius Gritzbach, assassinado a tiros no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, em novembro de 2024.
O Metrópoles teve acesso ao relatório final das investigações, que se iniciaram a partir do trecho da delação do corretor de imóveis que dizia respeito às extorsões que teria sofrido de policiais civis responsáveis pelas investigações que lhe atribuíram o assassinato do traficante Anselmo Santa Fausta, o Cara Preta.
Gritzbach morreu negando o crime e afirmou que policiais levaram relógios de luxo, se apropriaram de um sítio seu e de dinheiro vivo em meio a uma cobrança de R$ 40 milhões.
Somente a Rogerinho, a PF atribuiu os crimes de peculato, corrupção, associação criminosa, extorsão e lavagem de dinheiro. Como o Metrópoles já mostrou, ele tem um patrimônio milionário, é dono de um condomínio de casas no litoral sul paulista, sócio de uma empreiteira, e tem fama de ostentar uma vida de luxo nas redes sociais.
Rogerinho é companheiro de Danielle Bezerra dos Santos, que é viúva do ex-gerente do PCC Felipe Geremias dos Santos, o Alemão. A PF chegou a conclusão que o casal agia em conjunto.
Segundo a investigação, Danielle cobrava devedores de seu ex-marido falecido e contava com ajuda de Rogerinho para ameaçar essas pessoas e lavar o dinheiro do crime. Ambos mantinham contato com integrantes do alto escalão da facção e desfrutavam de corrupção e extorsões cometidas pelo policial civil, segundo a PF.
Em uma conversa identificada em um grupo de família de Danielle, há uma inconfidência. Ela recebeu uma mensagem de uma interlocutora que disse: “No fim das contas, casar com polícia e bandido dá no mesmo. Aí Deus, Rogério que não lê isso [sic], se não me enforca”. Daniella respondeu: “Com polícia a hipocrisia é maior. Rouba de quem rouba e paga de santo”.
Cobranças de dívidas
A PF extraiu mensagens do celular de Danielle que demonstraram que ela passou a cobrar dívidas que o criminoso tinha antes de morrer e, para isso, contou com ajuda de Rogerinho. Ela dizia a seus devedores que ficou responsável por “tirar o dinheiro da rua”.
“Se você quiser devolver o dinheiro, eu vou aceitar, pra mim é mais cômodo ficar recebendo juros seu do que receber o dinheiro? Claro, mas se você não tiver dando conta de pagar os juros, quem sou eu para falar alguma coisa, né? Obviamente que eu vou aceitar receber o capital, mas em espécie, da mesma forma que você pegou com Felipe, assim em imóvel não tem serventia nenhuma”, disse ela a um devedor.
Rogerinho debatia abertamente essas cobranças com Danielle. “É, mas tem que pagar, né? Tem que pagar, não é poucas ideia [sic]? Ele não falou que era você pra lá e eles pra cá, e ele ainda é zé povinho, não é nem bandido esse filho da puta, tem que te pagar sim”, disse em uma dessas conversas. Em outra conversa, mais agressiva, ele ameaça até usar viatura “caracterizada” e dar um “cassete” em um devedor.
Segundo a PF, Danielle mantinha contato com integrantes do alto escalão do PCC, como Márcio Barbosa da Silva, conhecido como Beiço de Mula, um dos líderes na região do ABC paulista. Nas mensagens com o traficante, foram encontrados até mesmo diálogos sobre uma briga dele com Rogerinho que teria sido resolvida com um agrado: foi oferecido a Beiço de Mula um camarote em um show onde o policial faria bico de segurança privada.
A PF também identificou mensagens que mostravam Rogerinho supostamente ajudando Danielle a operar dinheiro de seu pai, que estava foragido pelo crime de homicídio. Em meio a essas movimentações financeiras, foi identificado que Rogerinho usava uma empresa em nome de um testa de ferro que antes era operada pelo ex-marido de Danielle, o Alemão, antes de sua morte.
Segundo a Polícia Federal, “ao longo da investigação, restou evidente a participação de Danielle na distribuição de recursos que constituem produto de atividades ilícitas desenvolvidas pelo crime organizado no Estado de São Paulo, notadamente vinculadas ao PCC”.
“Os recursos de origem espúria que constituem objeto de branqueamento pelo casal são decorrentes, ainda, dos atos de corrupção policial levados a efeito por Rogerio, conforme demonstrado ao longo do apuratório”, conclui a PF.
O Metrópoles não conseguiu contato com as defesas de Rogerinho e Danielle. O espaço segue aberto para manifestações.