A turbulência pela qual a Azul (AZUL4) passa deve causar problemas para os acionistas minoritários, após a companhia aérea entrar com pedido de reestruturação nos Estados Unidos — o temido Chapter 11 — nesta quarta (28).
O plano é positivo do ponto de vista de manter o negócio funcionando enquanto executa uma reestruturação da aérea, mas os acionistas terão que “apertar os cintos” devido à volatilidade no curto prazo e ao risco de diluição acionária significativa.
Analistas do mercado financeiro ouvidos pelo Seu Dinheiro consideram que, por mais importante que a recuperação judicial seja para a Azul, a empresa está prestes a entrar em uma tempestade perfeita devido ao timing do anúncio.
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Além de um acordo com seus principais credores e parceiros estratégicos, a reestruturação de dívidas da Azul contempla US$ 1,6 bilhão em financiamento, eliminação de US$ 2 bilhões em dívidas e até US$ 950 milhões em novos aportes de capital quando o processo se encerrar.
O que pode acontecer com os acionistas minoritários?
De forma simples: os acionistas podem ver o poder de suas ações perder força quando a Azul emitir mais ações para levantar capital, diluindo o peso dos seus papéis da aérea.
No caso da Azul, parece haver uma priorização da preservação do modelo de negócio em detrimento de outras questões, como a manutenção das participações acionárias originais dos acionistas.
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, destaca que, apesar dos avanços no plano de reestruturação, os riscos permanecem elevados, com a diluição acionária significativa à vista, dada a magnitude do perdão e da reestruturação de dívidas.
“Embora o grau exato dependa dos termos finais do plano e da adesão dos investidores à oferta de ações da Azul, o próprio plano de recuperação antecipa a emissão de capital novo relevante, o que, combinado à conversão parcial da dívida e à participação de investidores estratégicos, deverá reduzir substancialmente a participação dos acionistas atuais”, explica o analista.
Casos recentes no setor aéreo reforçam o potencial de diluição dos minoritários. A LATAM e a GOL (GOLL4), por exemplo, passaram por processos semelhantes, resultando em diluições expressivas.
“Ainda que as empresas tenham saído mais saudáveis financeiramente, o custo dessa reestruturação foi também absorvido por esses investidores minoritários”, pontua Arbetman.
Quais outros riscos a reestruturação da Azul pode trazer para os acionistas?
O início do processo de reestruturação visa a fortalecer a posição financeira, manter as operações da companhia e lidar com a fase complicada que a Azul passa desde a pandemia, sendo a última das aéreas latino-americanas a pedir recuperação judicial.
Rafael Passos, analista da Ajax Assets, destaca que, dentre os riscos que podem colocar a Azul em uma posição perigosa durante a reestruturação, estão:
- O atraso nas entregas de aeronaves, o que pode comprometer o plano estratégico;
- A piora na procura de voos da Azul, assim como uma concorrência ainda mais acirrada, reduzindo margens;
- Exigência de maiores garantias para arrendamentos e fornecedores;
- Maior pressão por crédito;
- Um aumento na escassez de pilotos diante do potencial impacto da RJ no número de voos;
- Restrições na cadeia de abastecimento.
“De forma geral, a percepção de risco piora, mesmo que dê fôlego de curto prazo para a Azul, com o aumento de liquidez da companhia”, pontua Passos.
Apesar do cenário difícil, o processo é similar em escopo ao observado em outras companhias aéreas latino-americanas. A diferença? O timing da Azul.
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A companhia demorou mais para buscar essa proteção, tendo antes explorado diversas negociações privadas e tentativas de captação no mercado.
“A situação não é mais grave que as outras, mas reflete um ambiente estruturalmente desafiador para o setor no Brasil devido ao momento escolhido”, afirma Arbetman.
Qual o efeito da recuperação judicial da Azul?
Segundo apresentação divulgada pela Azul, o plano atual prevê a eliminação de mais de US$ 2 bilhões em dívidas e a injeção de aproximadamente US$ 670 milhões de nova liquidez via financiamento DIP (Debtor in Possession Financing) — financiamento prioritário que não é implementado em RJ no Brasil.
A liquidez do papel permanece ativa, mas o investidor precisa estar ciente da elevada volatilidade e incerteza.
Como os termos finais do plano de reestruturação ainda dependem de aprovações judiciais e dos acionistas, a recomendação é de cautela e paciência, especialmente para aqueles já posicionados, afirmam os analistas.
Segundo a empresa, o processo deve durar entre seis e nove meses, e a visibilidade sobre a estrutura de capital futura será maior conforme a Azul avance na negociação com os credores e finalize o plano de reorganização.
“O sucesso da reestruturação será fundamental para definir o valor de mercado remanescente para os acionistas atuais”, afirma o analista da Ativa Investimentos.
Como fica a fusão entre a GOL e Azul?
Sobre uma possível fusão com a GOL, a Azul informou que o foco agora é reequilibrar as finanças. Qualquer negociação com a concorrente deve ser retomada apenas após a conclusão da reestruturação.
Segundo relatório divulgado pelo BTG, qualquer negociação só deve avançar após a saída da Azul do Chapter 11, prevista para o final de 2025.
Dado o cenário atual, analistas acreditam que a fusão pode até ser retomada no futuro — mas somente se ambas estiverem em condições financeiras mais sólidas.
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Luís Fernando Guerrero, advogado especialista em recuperação judicial e direito empresarial, afirma que a fusão com a GOL pode não acontecer neste momento, mas não está excluída pela RJ.
“O grande ponto é que a GOL já resolveu a vida dela, se reestruturou e está seguindo. Não faria muito sentido se juntar a uma empresa que está iniciando esse processo. Bem ou mal, quando você opta por uma fusão, algum investimento, algum ajuste seria necessário”, explica o advogado.
Por que a Azul entrou com pedido de recuperação judicial nos EUA?
A decisão da Azul de recorrer ao Chapter 11 americano, ao invés da recuperação judicial em solo brasileiro, está relacionada à estrutura internacional de seu endividamento e aos riscos que isso poderia oferecer à continuidade de suas operações.
A escolha da aérea não é tão diferente da feita por pares latino-americanos, como a GOL e a LATAM, que também entraram sob o guarda-chuva americano para se reestruturar após os tombos que todas as aéreas sofreram na pandemia de Covid-19, de acordo com Guerrero.
“O judiciário dos EUA é mais amigável a esses processos quando envolvem companhias aéreas, enquanto a legislação brasileira pode impor entraves em pontos-chave para o funcionamento dos negócios da Azul. É uma escolha que foi pensada para manter o funcionamento da Azul da forma mais lisa possível”, explica o advogado.
Um exemplo disso é o processo de leasing — quando há um aluguel de um bem para um utilizador por um período definido —, que é uma prática amplamente utilizada por companhias aéreas para ter acesso a aeronaves, mas que é barrada pela legislação brasileira.
Também há o fator de que o mecanismo de recuperação nos EUA oferece mecanismos mais previsíveis para proteger o patrimônio e maior acesso a credores globais.
Segundo Filipe Denki, advogado e especialista em insolvência empresarial, o contexto atual reforça uma tendência já observada em outras empresas brasileiras, como LATAM e Oi, por reestruturarem suas dívidas fora do país.
“Quando há forte exposição a credores internacionais e contratos em moeda estrangeira, o ambiente jurídico norte-americano é percebido como mais estável. O Chapter 11 permite suspender ações e execuções globalmente, proteger ativos e negociar coletivamente com credores num só foro judicial”, explica Denki em nota.
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