Se a história da Petrobras (PETR4) nesta quinta-feira (27) fosse contada na forma de peça de teatro ou de ópera, o primeiro ato seria a explicação da presidente Magda Chambriard sobre as linhas do balanço do quarto trimestre de 2024, que levaram os papéis a abrirem o dia em baixa de mais de 3% — e esse não seria nem de perto o ápice do espetáculo.
Com um figurino amarelo-vivo que contrastava com a tensão entre os espectadores, Chambriard entrou na teleconferência de resultados com o texto pronto: “O prejuízo do quarto trimestre não tem nenhum efeito sobre o caixa da companhia, aconteceu por um item efetivamente contábil. Nosso caixa vai muito bem, reduzimos nossas dívidas e pagamos dividendos”.
Embora o prejuízo líquido de R$ 17 bilhões da Petrobras no quarto trimestre tenha pego o mercado de surpresa, está longe de ser o fator de maior preocupação em relação ao balanço que a estatal divulgou na noite desta quarta-feira (26).
Foi no segundo ato que Chambriard falou sobre o que o mercado esperava: o volume de investimentos (capex) nos últimos três meses de 2024.
“Antecipamos investimentos em Búzios, o maior e mais produtivo campo em águas profundas do mundo. Ou seja, teremos óleo novo, alto potencial de produção em um campo altamente rentável, com retorno econômico-financeiro inquestionável”, disse a executiva em teleconferência sobre os resultados do quarto trimestre de 2024.
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Segundo ato: investimentos da Petrobras e estouro da guidance
O chamado capex da Petrobras somou US$ 5,7 bilhões no quarto trimestre, acima dos R$ 4,4 bilhões dos três meses anteriores e das expectativas dos analistas. O Goldman Sachs, por exemplo, projetava investimentos de US$ 2,5 bilhões nos últimos três últimos meses de 2024.
O problema — para o mercado — é que o capex da Petrobras no ano como um todo atingiu US$ 16,6 bilhões e estourou a estimativa (guidance) da própria companhia, de cerca de US$ 14,5 bilhões — uma revisão dos US$ 18,5 bilhões originalmente previstos até agosto de 2024.
Esse aumento de 31% na comparação com os investimentos de 2023 pode significar o comprometimento da distribuição de dividendos aos acionistas. Chambriard, no entanto, disse que os aportes em Búzios garantirão proventos fartos no futuro.
“A gestão justificou que o aumento ocorreu por conta de antecipações de investimentos que deveriam ser feitos em 2025 e que, portanto, não deveriam afetar a perspectiva de geração de caixa futura da companhia. Ainda assim, esse é um tema que volta a preocupar os investidores e que será acompanhado de perto pelo mercado nos próximos resultados”, disse Ruy Hungria, analista da Empiricus Research.
Chambriard não vê riscos no horizonte — nem para a Petrobras e nem para os investidores.
“Entendo a reação do mercado sobre o pagamento de dividendos, mas antecipar investimentos em Búzios é tudo que o investidor pode querer, já que representa óleo no bolso mais rapidamente”.
E continuou: “Se fosse possível, anteciparíamos todo o capex de Búzios para hoje e os investidores ficariam felizes”.
Monique Martins Greco Natal, Eric de Mello e Bruna Amorim, analistas do Itaú BBA, concordam com a presidente da Petrobras.
“Consideramos que investir no desenvolvimento da produção do campo de Búzios é a melhor alocação de capital possível e respeitamos a avaliação técnica da empresa sobre o potencial de mitigação dessa medida em relação aos riscos de atraso. Portanto, não vemos a decisão de antecipar o capex como negativa em si”, escreveram os analistas.
O trio, no entanto, faz uma ponderação: “No entanto, acreditamos que a revisão para baixo da orientação do capex feita em agosto passado pareceu apressada e levou os investidores a esperar um pagamento potencial de dividendos maior, o que não se materializou”.
O mercado, no entanto, seguiu resistente. Assim que a presidente da Petrobras deu as explicações sobre o capex, os papéis da companhia aceleram as perdas para a casa dos 7%, renovando a primeira mínima intradia durante a teleconferência — e mais ainda estava por vir.
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Terceiro ato: as ações da Petrobras afundam quase 10%
O ápice — para as ações da Petrobras, pelo menos — veio no terceiro ato, quando Chambriard falou dos investimentos da estatal no segmento de fertilizantes.
Os papéis afundaram quase 10%, quando a executiva afirmou que a estatal estava “retornando ao segmento de fertilizantes, com a Ansa em 2025 e a retomada das obras da UFN III [Unidade de Fertilizantes Nitrogenados], a unidade de fertilizantes no centro-oeste”.
A reação tem uma explicação: a Petrobras abandonou de vez os investimentos em fertilizantes entre 2016 e 2020 sob o entendimento de que os potenciais de retorno desse segmento são menos atrativos do que o da exploração e produção de petróleo, o principal negócio da companhia.
Quando assumiu a presidência, em 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que a petroleira voltaria a investir na área.
“Ainda que os investimentos em fertilizantes sejam menos atrativos para a Petrobras quando comparados com exploração e produção, não representam um valor tão significativo a ponto de comprometer o caixa da companhia, por exemplo”, diz Hungria, da Empiricus.
Em agosto do ano passado, a Petrobras informou que investiria R$ 6 bilhões no segmento de fertilizantes no quinquênio, incluindo projetos em estudo. Deste total, R$ 870 milhões seriam destinados para a retomada das atividades da fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados S.A. (Ansa), no Paraná.
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Último ato: o recado final ao mercado e aos investidores
O último ato da teleconferência da Petrobras, Chambriard explicou — de novo — o motivo do estouro do guidance, voltou a minimizar o prejuízo do quarto trimestre e disse o que está por vir.
“Em meados de 2024 entendemos que não íamos gastar US$ 18,5 bilhões como indicava o guidance naquela ocasião, baixamos para US$ 14,5 bilhões. O que acontece de lá para cá é que a plataforma Maria Quitéria entrou em operação em outubro de 2024 e não neste ano como estava previsto e o mesmo ocorreu com [a plataforma] Almirante Tamandaré”, disse.
Sobre 2025, a presidente da estatal se mostrou otimista. “O prejuízo de agora não reflete a saúde financeira ou operacional da Petrobras, mas sim efeitos contábeis das subsidiárias no exterior, sem impacto no caixa. Com o dólar cedendo, parte desse valor já será lucro no primeiro trimestre de 2025”.
Antes de fechar as cortinas, mandou o recado final: “Quando voltarmos aqui para falar do resultado de 2025, vamos falar de uma Petrobras produzindo mais, com um aumento de produção da ordem de 100 mil barris de petróleo por dia, ajudada pela entrada de três novas unidades ao longo deste ano”.
Quando a teleconferência terminou, as ações da Petrobras reduziam as perdas, mas ainda lideravam a ponta negativa do Ibovespa. Por volta de 16h, PETR3 caía 4,96% e PETR4, -3,29%.
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