Os governos sucumbiram ao capital. Toda a ideia de o governo ter a dupla função, de mediação dos interesses dos grupos sociais em prol do bem comum, e de funcionalidade nos serviços para o bem social, foi por terra. Hoje, aumentam as diferenças econômicas entre os grupos sociais, conforme o “World Inequality Report”, onde o rico fica cada vez mais rico, com a compressão das classes médias e das classes trabalhadoras.
Marx, em o “Capital”, dizia que a clivagem fundamental do sistema capitalista está na oposição entre o capital e o trabalho, e que o lucro nas sociedades capitalistas iria continuamente aumentar devido à tendência do reinvestimento do capital disponível em capital fixo, ou tecnológico, ao invés de em capital variável, ou na remuneração do trabalho. E Wright Mills, em “A Elite do Poder”, diz que manda o capital, controla o militar, executa o político, e media o intelectual nas sociedades, aqui entendidos como imprensa e universidades.
Nos Estados Unidos, o cerne da democracia e da economia de mercado, Elon Musk assume, no Governo Trump, como “Ministro da Eficiência Governamental”, embora a suposição de ter descumprido regras de segurança nacional, no possível compartilhamento de segredos de estado em suas atividades empresariais com outros grupos de interesses e nações. Trump, no seu primeiro dia de governo, rompe as regras dos limites e da liberdade idealizadas pelos “Pais da Nação”, com perigosos devaneios de reincorporação do Canal do Panamá, posse da Groenlândia, e o Canadá como o 51º estado, mais como delimitação de espaço dentro da Doutrina Monroe na geopolítica mundial, mas apontador de tendência; retira os Estados Unidos do Acordo de Paris e da OMS; e perdoa a violência generalizada. Tudo em prol do capital. Manda quem pode, obedece quem tem juízo.
Na economia, existem hoje cerca de 2.500 bilionários no mundo, segundo o “Billionaire Ambitions Report” do Banco UBS, com a riqueza (assets financeiros e não financeiros) em US$ 12 trilhões; nominalmente equivalente a 12% do total do PIB mundial de US$ 106 trilhões; seis vezes maior do que a riqueza dos 50% da população mundial mais baixos na base da pirâmide. E segundo o “World Inequality Report”, os 1% mais ricos do mundo detém hoje 19% do PIB mundial enquanto os 50% mais baixos detém somente 8,5%; sendo a renda total dos 1% mais ricos 2,3 vezes maior do que a renda total dos 50% mais baixos da população.
Marx, ironicamente, dizia que a diferença entre o escravagismo e o capitalismo é a de que no capitalismo o trabalhador pode escolher na mão de quem ele passará fome. Somos hoje escravos ambulantes do capital, na alienação de pequenas marcas, no consumo de alguns produtos, na cegueira do amanhã. “Pão e circo” é o que não falta, nos gritos nos estádios e na compra de emblemas que nada nos representam e nada nos trazem, além de custos.
Somos hoje pobres mortais, à leva do destino que não mais nos pertence.
Ricardo Guedes é Ph.D. em Ciências Políticas pela Universidade de Chicago e Autor