Na busca por tornar as casas com “cara de lar”, muitas pessoas apostam em decorações que realcem a personalidade dos moradores e proporcionem um sentimento de refúgio – especialmente quando a intenção é se desligar do ritmo frenético do dia a dia. Além dos elementos decorativos, o cultivo de plantas tem conquistado espaço nos domicílios brasileiros como uma forma de embelezar os ambientes e proporcionar a tranquilidade intrínseca da natureza.
Esse universo verde tem ganhado cada vez mais adeptos, que passaram a ser apelidados de “pais e mães de plantas”. Esse é o caso do médico endocrinologista Flavio Cadegiani, de 40 anos.

O fascínio pela vegetação se tornou tão forte que, aos poucos, Cadegiani entrou para o mundo dos colecionadores de plantas raras, um mercado de luxo que abrange milhares de entusiastas dos tesouros botânicos. Em seu apartamento no Noroeste, o médico é responsável por um acervo de cerca de 250 plantas, incluindo “filhas únicas” que não existem em mais nenhum lugar do mundo. O custo de algumas delas varia de R$ 5.000 a R$ 27.000.
“Antes de me aprofundar no cultivo das plantas, nada me impressionava e me fazia sentir paixão. Após um momento difícil, comecei a comprar algumas mudas. A maioria morreu. Normalmente, afogada”, relembra.
Disposto a deixar de lado os “fracassos da paternidade” e diante de uma postura ávida por conhecimento, Cadegiani se debruçou nos estudos e encarou o cultivo de seu jardim vertical como um desafio pessoal. “Com as pesquisas, eu percebi que estava fazendo o caminho diametralmente oposto do que deveria ser feito para garantir vida longa às plantas. Nessas buscas, também encontrei espécies diferentes, e isso me fez querer me aprofundar ainda mais neste mercado de luxo“, detalha.

A exclusividade dos itens naturais foi o aspecto que mais brilhou os olhos do médico. “Eu sempre gostei daquilo que é diferente. Isso me desafia por inúmeras questões. Por exemplo, quando você tem uma planta que, por ser tão nova, não tem nem nome, você precisa descobrir como ela vai se comportar e ajustar os cuidados. É fascinante”, explica.
Atualmente, ele cultiva espécimes como a Alocasia Serendipity Pink Variegata, que o surpreendeu ao gerar uma nova folha em apenas 72 horas, e a Ilsemaniis, considerada muito rara e desafiadora. Além disso, Cadegiani é o responsável por batizar uma nova variedade mutante de costela-de-adão: a Monstera Chaos – um exemplar caótico e imprevisível, que nasceu de uma mutação espontânea e ganhou reconhecimento entre colecionadores.

“Ela gira em torno dela mesma, ela se multiplica, se desmultiplica. Ela tem um padrão completamente caótico. Embora não seja variegata, ou seja, plantas que apresentam folhas com coloração diferente, ela pode nascer com essa pinta. Ela é única no mundo, ainda nem conseguimos precificar”, detalha o colecionador à colunista Claudia Meireles.
Mercado brasileiro
De acordo com o médico, o cenário do colecionismo de plantas raras no Brasil está crescendo, muito por conta da busca por bem-estar, exclusividade e conexão emocional. Inclusive, o panorama é tão promissor que algumas pessoas estão migrando de profissão para atender à demanda do mercado brasileiro.
Os empresários Antônio Arrabal e Miguel Riviera, fundadores da Araceales Plantas de Coleção, são pioneiros no cultivo e curadoria de espécies raras em Holambra, capital nacional das flores. “O que era antes coleções de biólogos, botânicos, se expandiu para a população geral”, comenta Antônio.

Em entrevista à coluna Claudia Meireles, o sócio da loja on-line de tesouros botânicos revela que, no início, o universo “verde” era um hobby. Nem ele e nem Miguel pensavam em abrir um negócio.
“Por acaso, na internet, o Miguel viu uma foto da Monstera Variegata e quis ter uma. Foram quase seis meses para conseguir comprar a espécie no padrão que víamos no mercado internacional. A gente viajou para Brasília, para o Rio de Janeiro, Goiânia, tudo para tentar começar essa coleção. Nessas andanças, entre 2021 e 2022, que vimos a oportunidade de abrir um empreendimento que disponibilizasse plantas no padrão de qualidade que estávamos buscando e demoramos a encontrar”, explica Antônio.
Para conseguir avançar na curadoria, Antônio Arrabal e Miguel se mudaram para Holambra, município do Estado de São Paulo. “É onde todo o mercado de produção de plantas verdes acontece. Grande parte da distribuição de plantas que vemos nos supermercados, em comércios e em ambientes de paisagistas sai de lá”, detalha.
Como iniciar no colecionismo de plantas raras
Para quem tem interesse em adquirir e começar um acervo de tesouros botânicos, o colecionador Cadegiani aconselha aos iniciantes que comecem com espécies acessíveis e fáceis de cuidar – como as Monsteras ou costela-de-adão.
“Foi onde eu comecei e me apaixonei. Também indico adquirir plantas mais baratas, para você não ter uma perda tão significativa, inclusive, no bolso”, recomenda o médico.
Para Antônio Arrabal, o cultivo é mais simples do que parece. “A planta exige um processo de aprendizado. Antes de mais nada, é preciso aprender sobre a rega, ou seja, a necessidade de água da planta. Na regra é onde tem todo ou grande parte do seu êxito”, explica.

Usando como exemplo as plantas da espécie Araceae, Cadegiani avalia que não é preciso se preocupar com a hidratação diária. “Elas são fáceis e os cuidados são simples. Basta regá-las uma vez por semana”, comenta.
O colecionador também revela que ter conhecimento sobre os chamados giveaways, um sistema de doações bastante popular em países como a Inglaterra, pode contribuir na hora de começar um acervo. “À medida que eu fui comprando plantas mais raras, as mais comuns foram migrando. Para tornar esse sistema rotativo, você doa as mais baratas para alguém que deseja começar e aprender”, explica Cadegiani.
Cultivo e saúde mental
Na avaliação do colecionador e de Antônio, ser “pai e mãe de planta” oferece benefícios para a saúde geral dos indivíduos, indo além do que se pode imaginar.
“A gente já teve cliente com quadro de depressão, de ansiedade e que encontrou um refúgio no cultivo das plantas, na dedicação, ou seja, em ver o tempo empenhado e perceber um resultado positivo. A planta cumpre um papel importante nesse processo terapêutico”, comenta Antônio.
No caso de Cadegiani, esse ecossistema verde fez com que ele entendesse que há tempo para tudo e é preciso ter paciência para viver o “aqui e o agora”.
“Quando você trata a planta, você está se tratando. Se você tem a tranquilidade de saber que a planta nem sempre vai se comportar da forma que você espera, isso traz tranquilidade. Você reconhece que não tem controle nem dos ganhos nem das perdas”, ressalta Cadegiani.
Confira parte do acervo de plantas raras de Flavio Cadegiani:
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