Um dos diretores afastados do cargo pela Secretaria Municipal de Educação (SME) nesta sexta-feira (23/5) trabalha em uma escola premiada, justamente, por causa dos projetos pedagógicos construídos ali.
Cláudio Marques da Silva Neto está na Escola Espaço de Bitita, no Canindé, zona norte da cidade, desde 2011. De lá para cá, ele acompanhou algumas premiações e feitos relevantes dentro da unidade.
Na direção, foi um dos nomes por trás do projeto que integrou estudantes imigrantes à rede municipal de ensino. A escola, já naquela época, era conhecida por receber alunos de outras nacionalidades – o número aumentaria expressivamente nos últimos anos, representando agora 40,5% dos discentes.
Por causa da iniciativa com os estrangeiros, em 2017 a escola levou o prêmio “Faz a Diferença” do grupo Globo.
Naquele mesmo ano, a escola foi uma das premiadas pelo Instituto Tomie Ohtake com outro projeto, o “Roteiros de Aprendizagem”, que abordava temas como violência contra a mulher, racismo e homofobia com os estudantes do 8º ano.
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Em 2018, uma professora da escola ganhou o prêmio “Educador Nota 10”, promovido pela Fundação Victor Civita com o projeto “O Migrante Mora em Minha Casa”. A iniciativa tratava com os alunos a questão da discriminação com pessoas de outras nacionalidades.
O mesmo projeto alcançou ainda o terceiro lugar no Prêmio Municipal de Educação em Direitos Humanos naquele ano.
Apesar dos prêmios, a nota baixa da unidade na última edição do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e do Índice de Desenvolvimento da Educação Paulistana (Idep) levou o diretor a entrar na lista da Secretaria Municipal de Educação para passar por uma formação. Assim, ele ficará afastado do cargo até o fim do ano letivo. No último Ideb, a unidade tirou nota 4,8.
Cláudio questiona a decisão de tirá-lo da escola ser baseada apenas nos dois indicadores. Segundo ele, fatores importantes que explicariam a nota estão sendo desconsiderados pela gestão municipal.
Um deles, por exemplo, é o número expressivo de alunos de outras nacionalidades.
“Como é que, em uma avaliação que é baseada fundamentalmente no fator linguístico e na lógica matemática, você vai esperar que uma escola que tem 40% de pessoas imigrantes ou refugiadas vai atingir a nota máxima em português?”.
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EMEF tem alunos de várias nacionalidades
Rovena Rosa / Agência Brasil2 de 4
Diretor Cláudio
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Estudantes estrangeiros da EMEF Espaço Bitita
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EMEF Espaço Bitita se chamava EMEF Infante Dom Henrique por isso
Rovena Rosa / Agência Brasil
“Na última prova, teve uma garotinha de Bangladesh que saiu chorando da sala de aula porque ela sabia os conhecimentos da disciplina, mas não sabia a língua portuguesa”, diz ele, contando que seus alunos têm como primeira língua idiomas como árabe, persa, entre outros.
O coordenador pedagógico da EMEF Espaço de Bitita, Carlos Eduardo Fernandes, endossa a questão. Ele diz que em 2023, quando o último Ideb foi medido, a escola tinha duas turmas de 5º ano, com imigrantes recém-chegados no país.
“Parte desse grupo não estava sequer alfabetizado [em português]. É impossível que a gente, no tempo em que se faz o processo de avaliação, consiga chegar nos mesmos índices de escolas que estão trabalhando com as crianças há 5 anos”, diz o coordenador.
Entenda o caso
- A Prefeitura de São Paulo determinou o afastamento de 25 diretores de escolas municipais por causa do desempenho dos alunos em indicadores de educação. Os profissionais foram informados da medida na quinta-feira (22/3).
- Eles trabalham em unidades de tempo integral e estão há pelo menos quatro anos na função, segundo a secretaria.
- A gestão Ricardo Nunes (MDB) alega que os profissionais passarão por uma “requalificação intensiva do Programa Juntos pela Aprendizagem”, criado em abril deste ano com o objetivo de melhorar os indicadores da rede.
- A medida é adotada depois que os baixos indicadores da prefeitura na Educação viraram alvo de críticas durante a campanha de Nunes ,em 2024, e ameaçaram a continuidade de Fernando Padula à frente da pasta.
Os educadores ressaltam ainda que a escola recebe muitas crianças que vivem nos abrigos da Prefeitura no bairro e, por isso, permanecem por pouco tempo na unidade. Segundo os dois, a rotatividade chega a 20% dos alunos.
“A escola é reflexo de uma sociedade, não está sozinha. Mas a gente foi isolado com essa decisão”, diz Carlos.
Em nota, a Secretaria Municipal da Educação afirma que os 25 diretores de escolas municipais em tempo integral foram “convocados para participar, entre maio e dezembro, de uma requalificação intensiva do Programa Juntos pela Aprendizagem”.
“Esses profissionais atuam há, pelo menos, 4 anos em unidades prioritárias, selecionadas devido ao desempenho obtido no Ideb e Idep de 2023. A capacitação, inédita, inclui vivência em outras unidades educacionais e tem como objetivo o aprimoramento da gestão pedagógica para melhorar a aprendizagem de todos os estudantes”.
A pasta afirma que as unidades contarão com reforço de mais um profissional na equipe gestora neste período e que a remuneração dos diretores será mantida.