As mudanças recentes, que pegaram de surpresa a diáspora italiana por todo o mundo – e especialmente no Brasil – acenderam um alerta também para quem deseja solicitar cidadania por descendência em outros países da Europa. Mas, ao menos no caso da Espanha, a Lei da Memória Democrática está reacendendo a esperança de muitos brasileiros com raízes que sonham em obter a nacionalidade espanhola.
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Indo além de seus objetivos primários de reparação histórica, a lei expande significativamente as opções para que descendentes de espanhóis possam reivindicar sua cidadania.
Ao apresentar as mudanças no Regulamento de Imigração, Elma Saiz, ministra da Inclusão, Segurança Social e Migrações do governo espanhol, enfatizou: “O objetivo é reforçar e ampliar os canais de acesso à regularização de migrantes que estão na Espanha, para que eles possam levar uma vida plena como cidadãos”.
Essa oportunidade, no entanto, tem prazo definido: a lei estará em vigor até 21 de outubro de 2025. Diante deste cenário, surge a dúvida: quais os procedimentos e documentos necessários para a solicitação da cidadania espanhola por meio da Lei da Memória Democrática? Guiados por uma especialista, é o que respondemos a seguir.
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O que é a Lei da Memória Democrática?
“A Lei da Memória Democrática, também conhecida como Lei dos Netos, tem como principal objetivo reparar os danos causados pela Guerra Civil e pela ditadura franquista na Espanha, garantindo a cidadania espanhola a descendentes de espanhóis sem exigir residência no país”, explica Rebeca Albuquerque, advogada e CEO da Acestra Cidadania Europeia.
A grande diferença em relação às legislações anteriores reside na simplificação do processo e na dispensa da necessidade de residir na Espanha para solicitar a nacionalidade. “O processo foi simplificado e pode ser feito apenas com a apresentação de certidões de registro civil, como certidões de nascimento e casamento e, em alguns casos, comprovantes de exílio ou perseguição”, detalha a advogada.
Diante da complexidade que pode envolver a reunião de documentos e da alta demanda nos consulados, Albuquerque reforça: “É importante iniciar o processo o quanto antes, pois reunir os documentos pode levar tempo e os consulados estão recebendo muitos pedidos. Como o prazo para solicitar a cidadania tem data limite, é essencial se organizar bem para garantir que tudo esteja pronto a tempo”.

LMD: uma corrida contra o tempo
A Lei da Memória Democrática gerou uma demanda global extraordinária pela cidadania espanhola. Até abril de 2025, já haviam sido registradas cerca de 678.000 solicitações em todo o mundo, segundo o Ministério de Assuntos Exteriores, União Europeia e Cooperação (MAEC) da Espanha.
Essa avalanche de pedidos tem um epicentro claro: a América Latina, de onde provêm mais de 95% das solicitações, ainda conforme o MAEC. Consulados na Argentina e Cuba, por exemplo, respondem por mais da metade de toda a demanda global. No Brasil, a situação reflete esse cenário de alta pressão.
Os dados sobre a comunidade brasileira na Espanha revelam um interesse crescente pela nacionalidade espanhola e um aumento contínuo da população residente.
Em 2023, 5.986 brasileiros obtiveram a nacionalidade espanhola pela via da residência, um aumento expressivo de 144% comparado a 2022, aponta o Instituto Nacional de Estadística (INE). Paralelamente, a população de nacionalidade brasileira residente na Espanha atingiu 101.779 pessoas em janeiro de 2024, um crescimento de 4,5% em relação ao ano anterior.
Brasileiros de ascendência espanhola: quem se beneficia?
A nova legislação contempla grupos específicos que, devido a contextos históricos, tiveram seu direito à nacionalidade espanhola dificultado ou perdido. Segundo Albuquerque, a lei beneficia principalmente três grupos de pessoas.
- Filhos e netos de espanhóis que nasceram fora da Espanha: após adquirir a cidadania, eles podem transmiti-la aos bisnetos, desde que ainda estejam no prazo legal.
- Descendentes de espanhóis exilados por motivos políticos, ideológicos, religiosos ou por identidade ou orientação sexual, e que, por causa disso, perderam ou renunciaram à nacionalidade espanhola.
- Filhos e filhas de mulheres espanholas que perderam a nacionalidade ao se casarem com estrangeiros antes da entrada em vigor da Constituição de 1978.
Passo a passo e documentação necessária
Para aqueles que se enquadram nos critérios, o processo de solicitação segue etapas bem definidas.
“Inicialmente, é importante verificar se o interessado atende a todos os requisitos para a solicitação. Após reunir toda a documentação completa e devidamente apostilada, deverá ser feito um agendamento para a apresentação presencial dos documentos no Consulado da Espanha. Concluído esse trâmite, o pedido será analisado e poderá ser deferido ou não,” descreve a advogada.
Quanto aos documentos, a lista é específica. “Os documentos essenciais para esse processo são: documento de identidade do solicitante; certidões de nascimento e casamento de todos da linhagem, desde o nacional espanhol até o requerente, além dos formulários correspondentes ao tipo do pedido”, elenca a especialista.
Um ponto importante diz respeito à comprovação do exílio.
“A situação de exílio será presumida em relação a todos os espanhóis que saíram da Espanha entre 18 de julho de 1936 e 31 de dezembro de 1955. A comprovação será necessária apenas quando a saída da Espanha ocorreu entre 1º de janeiro de 1956 e 28 de dezembro de 1978”, esclarece Albuquerque.
Para este segundo grupo, “deverão ser apresentados documentos específicos acompanhados de passaporte com carimbo de entrada no país anfitrião; certificação de registro em repartição consular espanhola; certidões de registro civil que comprovem a residência no país anfitrião, entre outros”.
Caso o Consulado solicite documentos complementares, será concedido o prazo de 30 dias para a apresentação do solicitado, informa a advogada.
Detalhes sobre os documentos e onde solicitar
Uma dúvida frequente é sobre a necessidade de tradução e a forma de obtenção de certidões antigas.
“As certidões devem ser emitidas no formato de inteiro teor e serem devidamente apostilados. Não é necessário traduzir as certidões brasileiras para a língua espanhola, o consulado espanhol aceita as certidões em português,” tranquiliza a advogada.
Para quem precisa localizar documentos de seus antepassados espanhóis, a advogada indica o caminho: “As certidões espanholas podem ser obtidas por meio de solicitação pela via eletrônica, através do site do Ministério da Justiça espanhol (mjusticia.gob.es/es)”.
Finalmente, sobre o local para dar entrada no pedido, Albuquerque é clara: “O pedido deve ser feito perante um Consulado da Espanha no Brasil de acordo com área onde o requerente reside, que agendará a ida do interessado pessoalmente à autoridade consular munido de formulário próprio e documentação comprobatória”.
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