A Justiça decidiu que não houve união estável entre a ex-dona de barraca que ganhou R$ 103 milhões na Mega-Sena e o ex-motorista de kombi antes do casamento, em briga judicial revelada pela coluna. Por isso, a mulher não precisará repartir o prêmio com o ex-marido, que também terá que pagar os honorários advocatícios. Ainda cabe recurso.
Como a coluna revelou em janeiro, a mulher recebeu o prêmio em outubro de 2020, se casou dias depois e, após nove meses, se separou.
O ex-motorista de kombi, então, acionou as autoridades para ter acesso à metade do valor, mais danos morais. A reportagem teve acesso ao processo da Mega-Sena e preservou os nomes dos envolvidos e a localidade por questões de segurança.
“Entendo que os elementos constantes do processo não têm o condão de demonstrar a configuração da alegada união estável que, embora incontestável a existência do relacionamento amoroso entre as partes, migrando etapas até o casamento sem que, com isso, tenha espaço para se reconhecer a união estável, à ótica da lei”, informa a sentença do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL).
O processo judicial foi impetrado um ano após o fim do relacionamento, porque, justifica a defesa do ex-motorista de kombi, ele estava com medo do “poderio econômico” dela. A Justiça mandou bloquear 50% dos bens dela, o correspondente a R$ 66 milhões, em dezembro de 2023. Porém, só encontrou R$ 22,5 milhões em contas diferentes. Uma decisão de fevereiro de 2024 liberou 10% desse valor.
Os bens dela só serão desbloqueados quando houver trânsito em julgado, isto é, não couber mais possibilidade de recurso na Justiça.
“Uma vez certificado o trânsito em julgado, procedam a liberação das contas e bens bloqueados por este juízo, em favor da ré e, cumpridas as formalidades legais, arquivem os autos, com a devida baixa na distribuição”, diz a sentença à qual a coluna teve acesso.
Além do casamento em separação total de bens, consta na certidão de divórcio que não havia bens a partilhar. Nos autos do processo, constam doações dela ao então marido e aos filhos dele. Amigas também foram agraciadas financeiramente, com parte do prêmio da Mega-Sena. Foram quantias por volta de R$ 100 mil a R$ 120 mil, de acordo com depoimento dela.
Segundo a defesa dela disse à coluna, a mulher chegou a mudar de cidade por razões de segurança diante da fortuna obtida com a Mega-Sena. Vive, hoje, com parte do prêmio, já que a Justiça bloqueou o restante a pedido dele.
Procurada pela coluna para se manifestar sobre a nova decisão, a defesa do ex-motorista de kombi não respondeu.
Entenda o processo da Mega-Sena
O debate levantado pela defesa do ex-marido gira em torno do relacionamento que os dois tiveram antes do casamento. O homem alegava que ambos viveram uma união estável durante esse período e, portanto, ele teria direito a uma parte do prêmio da Mega-Sena.
![Números sorteados do concurso 2306 da Mega-Sena](https://portal24hrs.com.br/wp-content/uploads/2025/02/concurso-2306-mega-sena-1200x674-1.jpeg)
Judicialmente, toda união estável não registrada em cartório, mas depois comprovada, ocorre em comunhão parcial de bens. Isso daria a ele metade do prêmio da Mega-Sena, conforme pediu na Justiça. Mas esse tipo de união precisa ser duradoura, pública e com intenção de constituir família para ser caracterizada como tal. O relacionamento dos dois, no entanto, durou apenas sete meses entre o início do namoro e o casamento, e eles sequer moravam juntos.
Para tentar comprovar a união estável e obter parte do prêmio da Mega-Sena, o homem alegou que os dois tinham relações sexuais antes do casamento e acrescentou que dormiam juntos em um colchonete de solteiro dentro da barraca dela. “Às vezes, você tem uma mulher que é fogosa, né? Não tem como segurar”, afirmou em depoimento.
A mulher, por sua vez, nega a intimidade. Em depoimento, ela explicou ser evangélica e assegurou que “não teve nenhum contato” com ele antes do matrimônio. A empreendedora acrescentou que ficaram noivos com pouco tempo de namoro pois “a igreja não quer que demore muito tempo para não fazer ato sexual antes de se casar”.
O homem acrescentou que os dois tinham uma conta-conjunta bancária, mas que nunca fizeram movimentações financeiras. Documento da Caixa Econômica Federal juntado ao processo, porém, aponta que se trata de uma conta individual.
A defesa dele afirmou à coluna, ainda, que os números e o dinheiro apostado na Mega-Sena eram dele. Novamente, ela nega. Nesse sentido, a sentença anota:
“Sobre a tentativa do autor de atribuir os números escolhidos no bilhete sorteado, alegando que faziam referência a determinadas datas a ele relacionadas, não há comprovação alguma nesse sentido, bem como de que fora ele quem solicitou à ré que se dirigisse ao estabelecimento lotérico para fazer, em nome dele, a aposta.”
O relacionamento
O casamento-relâmpago entre uma dona de barraca que ganhou na Mega-Sena e um motorista de kombi se desfez por “grosserias” da parte dele, disse a mulher em depoimento à Justiça. A milionária começou a namorá-lo em abril de 2020, ficou noiva em agosto e recebeu R$ 103 milhões da loteria em outubro, dias antes da cerimônia. Mas o matrimônio pereceu em apenas 9 meses e, agora, o homem processa a ex-companheira e cobra a metade do prêmio.
Para a empreendedora, que considera o prêmio da Mega-Sena um “milagre”, o homem “não tinha modos”.
“Eu decidi [terminar] pelo simples fato de que ele era uma pessoa muito grossa, não me tratava bem. Teve uma vez que eu saí, já estava casada com ele, aí fui pra um hotel, levei os filhos dele… Isso foi no mês de abril, março, porque tem época que a Páscoa é em março, tem época que é início de abril. Então não lembro exato. A gente já estava casado. Aí tem acho que é… aquelas piscinas que fazem barulho. Aí ele [disse] na frente de todo mundo: “Oxe, parece ela no banheiro. A senhora sabe o que tá fazendo, né?”. Aí eu fiquei muito humilhada, chorei. Ele não tinha modos”, disse em depoimento.
Já a defesa do ex-motorista alegou à coluna que o divórcio ocorreu quando o homem estava internado para tratar problemas no coração. A mulher nega. “A gente se separou ainda dentro de casa”, afirmou ela, se referindo a um período antes da hospitalização.